quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Desafios e considerações finais de Políticas Públicas e Gênero



A ampliação do papel dos governos subnacionais na formulação e implementação de políticas públicas nos últimos anos foi acompanhada pela inclusão de novos temas no campo de atuação dos governos estaduais e locais. Dentre estes novos temas, inclui-se a questão de gênero.
A incorporação da questão de gênero por governos locais tem se dado tanto por programas dirigidos à mulher como pela incorporação da dimensão gênero em programas de diversos setores, que não têm a mulher como foco específico.
Tal incorporação nem sempre significa, no entanto, “aderência” à agenda de gênero. Embora haja já em curso uma série de iniciativas locais que interferem sobre a desigualdade de gênero, incorporando a agenda construída por movimentos de mulheres nas últimas décadas,há ainda muitas políticas e programas que, embora focalizem as mulheres ou a elas dirijam módulos de programas mais gerais, acabam por reiterar desigualdades de gênero, reafirmando uma posição tutelada e subordinada da mulher tanto no espaço público como no privado.
Outro ponto a destacar nestas reflexões finais diz respeito ‘a tensão entre duas vertentes da agenda de gênero. A primeira vê a mulher sobretudo a partir de sua função na família, devendo as políticas públicas “investir” nas mulheres pelo efeito multiplicador que tal ação pode ter sobre a família e sobre a sociedade como um todo. Dentre as iniciativas aqui mencionadas,programas da área de saúde, como foco no segmento materno-infantil, aproximam-se em geral desta perspectiva.
Uma segunda vertente – hegemônica na agenda dos movimentos de mulheres no Brasil tem por base a perspectiva de direitos. Segundo esta vertente, trata-se de garantir a ampliação do espaço da cidadania, pela extensão de direitos a novos segmentos da população e pela inclusão destes novos segmentos na esfera do atendimento estatal. As iniciativas da área de saúde que adotam a perspectiva de atenção integral e os programas de combate à violência contra a mulher parecem ser tributários desta perspectiva, na maior parte dos casos.
Mas o “alinhamento” dos programas a uma destas vertentes da agenda de gênero nem sempre é evidente. Por exemplo, no caso dos programas de geração de emprego e renda, a priorização das mulheres é defendida tanto pelos que enfatizam o impacto deste apoio no combate à pobreza, como pelos que enfatizam a busca da autonomia das mulheres, vítimas da pauperização. A análise de cada situação concreta permitirá identificar a ênfase dada por cada programa e seu potencial mais ou menos emancipador, assim como seu impacto efetivo em termos de redução das desigualdades de gênero.
Para finalizar, gostaríamos de destacar alguns desafios ainda presentes para as envolvidas e os envolvidos na incorporação do enfoque de gênero por políticas públicas:
1. Em primeiro lugar, há o desafio de incorporação do olhar de gênero, da perspectiva
das mulheres, a todas as políticas públicas municipais. Isto significa que, ao se formular e implementar uma política ou um programa de governo, pode-se e deve-se ter em mente as seguintes perguntas:
a. Como a relação homem-mulher se dá nesta área?
b. Como se dá a inserção da mulher neste campo, nesta atividade?
c. Esta inserção reflete acesso equivalente ao dos homens (ou há um acesso desigual)?
d. A situação específica da mulher é considerada pelo programa e, se não, isto de alguma forma a prejudica?
e. Como as desigualdades de gênero identificadas nesta área específica podem ser combatidas pela política ou programa?
2. Um segundo desafio – ligado ao primeiro – é o desafio da integração. Muitas vezes
uma ação isolada perde parte de sua eficácia se não contar com apoio de outro setor. Assim,por exemplo, no combate à violência contra a mulher, o atendimento “completo” às vítimas da violência doméstica, capaz de garantir sua reinserção social, não se esgota no atendimento emergencial que lhe garanta cuidados de saúde, atendimento psicológico e jurídico e mesmo a casa abrigo. É fundamental o apoio para que a mulher vítima de violência doméstica tenha garantida a sua inserção (ou reinserção) no mercado de trabalho, o que lhe permitirá obter autonomia.
Ainda nesta área, não basta tampouco atuar “protegendo” e acolhendo as mulheres vitimizadas. É preciso evitar a violência. E uma das formas importantes de atuar neste sentido consiste na penalização da violência doméstica. Neste caso, é fundamental uma articulação que transcende o próprio executivo e o próprio nível local, envolvendo legislativo e judiciário.
Seria importante, assim, construir uma rede que articule profissionais e servidores de diferentes órgãos públicos, evitando que a questão de gênero seja vista como algo circunscrito a um único órgão.
3. Um último desafio diz respeito à relação com a sociedade civil. Embora seja um
passo fundamental a abertura de diálogo com os movimentos organizados na etapa inicial de definição da agenda, de prioridades, e de formulação de políticas, é importante que os canais de “diálogo” permaneçam abertos, para que seja possível uma “correção de rumos”,pois não é possível prever tudo de antemão e porque a realidade sofre alterações constantes,redefinindo as próprias demandas.
Tão importante quanto esta disponibilidade para o diálogo permanente, é a abertura para demandas difusas, isto é, que não venham de grupos organizados. É importante que, uma vez iniciado um programa ou política, os responsáveis por sua implementação e execução sejam sensíveis às demandas que recebem, nem sempre previstas originalmente, permitindo redefinições do rumo do programa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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FALÚ, Ana e RAINERO, Liliana. Pobreza urbana y genero. Taller sobre pobreza urbana en América Latina y el Caribe. Rio de Janeiro, 14-16 maio 1996 (Issues Notes)
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FARAH, Marta Ferreira Santos. Gênero e políticas públicas no nível subnacional de governo. Anais   do XXVI Encontro Anual da ANPOCS, 22 a 26 de outubro de 2002 b, Caxambu (CD).
FUJIWARA, Luis. Governo: substantivo feminino? gênero e políticas públicas em governos subnacionais.São Paulo, FGV-EAESP, 2002 (Dissertação de mestrado em Administração Pública e Governo).
GÊNERO nas administrações: desafios para prefeituras e governos estaduais. São Paulo, Fundação
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LAVINAS, Lena. As mulheres no universo da pobreza: o caso brasileiro. Estudos Feministas, ano 4, 2º semestre 1996, p.464-479.
_______. Políticas públicas de gênero: considerações. In: GÊNERO nas Administrações: desafios para prefeituras e governos estaduais. São Paulo, Fundação Friedrich Ebert, 2000. p. 36-38. (Trecho de
exposição)

PLATAFORMA DE ACCION. Borrador del documento que se aprobara en la IV Conferencia Mundial sobre las Mujeres. Beijing, Septiembre, 1995
RELATÓRIO sobre o desenvolvimento humano no Brasil 1996. Rio de Janeiro: IPEA, Brasília, DF:
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SOUZA-LOBO, Elisabeth. A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência. São
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SUÁREZ, Mireya, TEIXEIRA, Marlene e CLEAVER, Ana Julieta. Gestão local e desigualdades de gênero.Brasília: Agende, 2002.
SUPLICY, Marta. Conferência Mundial. Brasília, http://evirt.com.br/ mulher/ cap.23), s/d.
THE WORLD BANK. Toward gender equality: the role of public policy. Washington, D. C., The World Bank, 1997.
SITES CONSULTADOS
http://inovando.fgvsp.br 
Postado por:#MSUL Priscila Pavão Perim,sendo que as considerações foram debatidas com a participação do Grupo 02 Saúde MSUL:
#MSULSoraia Bertonceli,#MSUL Neise Araujo, #MSUL Cristina de Melo, #MSUL Andrea de Melo, #MSULRaquel Rabelo, #MSUL Maria Vanderleia Saluci, #MSUL Érika silvestre, #MSUL Jordana Ferraz.

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